sexta-feira, 28 de maio de 2010

Tecnologia e Metodologia

Este curto vídeo, desenvolvido pela Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC, permite-nos pensar de que modo o uso de tecnologias nas escolas, de fato, alteram o modo de organizar o ensino. Acredito que a simples introdução de tecnologias não gerará mudanças na educação que temos. O uso de tecnologias, presentes nas nossas relações diárias e na educação, demanda a redefinição de algumas práticas educativas.

O vídeo está disponível no You Tube, com o título "Tecnologia e Metodologia".

terça-feira, 25 de maio de 2010

Necessário Estímulo à Formação de Professores



Artigo de Wanderley de Souza 
JC e-mail 3802, de 10 de Julho de 2009.


“Como melhorar o nível acadêmico dos milhares de professores hoje em sala de aula? Como atrair os melhores jovens egressos dos cursos de bacharelado e licenciatura para a atividade docente?” Wanderley de Souza é professor titular da UFRJ, diretor de Programas do Inmetro e membro da Academia Brasileira de Ciências e da Academia Nacional de Medicina.

Por qualquer ângulo que se analise a questão da qualidade da educação no Brasil, só vamos encontrar indicadores positivos quando se trata da pós-graduação.O sucesso atingido na formação de mestres e doutores em número crescente explica a produção crescente de conhecimento acadêmico, que nos coloca, atualmente, entre os 13 países principais na produção de artigos publicados em revistas de elevado prestígio internacional.

No que se refere ao ensino de graduação, temos sérios problemas estruturais, com um declínio preocupante de atividades práticas durante o curso. No entanto, um forte programa de iniciação científica supre parte das deficiências e tem levado à formação de graduados de excelente nível em quase todas as áreas do conhecimento.

É no campo do ensino básico que os indicadores apontam para uma situação crítica. Em relação a aspectos qualitativos, os resultados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa) mostram que ocupamos a 48ª posição em leitura e a 52ª em ciências, entre os 56 países avaliados.

Os dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) indicam que o desempenho dos alunos, em 2007, em provas de português e de matemática foi inferior ao obtido em 1995. No que se refere a aspectos quantitativos, chama a atenção o fato de que apenas 37% dos alunos que ingressam no ensino fundamental chegam ao final do ensino médio. Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNDA) mostram que 20% dos jovens entre 18 e 29 anos que vivem na zona urbana não completam o ensino fundamental.

Apenas estes dados já são suficientes para deixar claro o que percebemos nas conversas cotidianas ou nas visitas às escolas públicas. Reverter este quadro constitui o maior desafio para a educação brasileira. Certamente, tal reversão é possível, mas exigirá uma atuação continuada em vários setores, o que inclui infraestrutura física, infraestrutura laboratorial, melhoria salarial dos profissionais envolvidos com educação e, o que me parece mais importante neste momento, estímulos para que os nossos melhores jovens vejam na atividade docente uma possibilidade de realização profissional, como já o foi no passado.

A decisão recente de colocar a Capes, que é uma Fundação vinculada ao MEC e que já se mostrou competente para tratar da pós-graduação brasileira, na linha de frente de um processo de apoio ao ensino básico traz uma nova esperança. Por sua experiência e tradição a Capes pode desempenhar papel relevante, sobretudo no processo de formação de professores mais motivados e melhor capacitados.

Como melhorar o nível acadêmico dos milhares de professores hoje em sala de aula? Como atrair os melhores jovens egressos dos cursos de bacharelado e licenciatura para a atividade docente?

A saída que me parece mais viável, ainda que seu efeito só poderá se tornar perceptível lentamente, é um forte incentivo governamental que dê oportunidade a que uma parcela significativa dos professores atuais, e um contingente crescente dos novos professores, façam cursos de atualização bem planejados e organizados e que levem a uma especialização.

Os professores que se engajarem em um programa como este devem ser estimulados a ingressar em um regime de tempo integral na escola, recebendo inicialmente uma bolsa. Esta deveria ser, posteriormente, substituída por gratificação significativa que assim elevaria o salário do professor a níveis compatíveis com sua importância na sociedade.

Alguns dos professores já em exercício e jovens recém-licenciados deveriam ser estimulados a obter uma formação mais elevada, através de programas de Mestrado Profissional em Atividades de Ensino. Nesse caso, o valor da bolsa deveria ser superior ao praticado atualmente para o mestrado acadêmico (R$ 1.200 por mês) e próximo ou igual ao de doutorado (R$ 1.800 por mês).

Desta forma, um sinal claro de incentivo estaria sendo dado pelo governo. Aqui, a união dos governos federal, estaduais e municipais é fundamental para que o programa atinja o maior número possível de professores.

Por que enfatizar o mestrado profissional? Vejo nesta modalidade de curso de pós-graduação, introduzido recentemente para atender demandas do setor produtivo, uma grande oportunidade para formarmos professores com uma nova mentalidade.

Neste curso é fundamental que durante o processo de formação do professor ele adquira um sólido embasamento nas mais diferentes áreas, tendo como referência o currículo do ensino ao qual vai se dedicar, aliado a uma excelente formação no uso dos métodos mais avançados de ensino prático e bases pedagógicas modernas. O professor melhor qualificado e bem remunerado terá muito mais condições de motivar a nossa juventude.

Publicado originalmente no Jornal do Brasil, 10/7/09

segunda-feira, 24 de maio de 2010

MEC vai recomendar o fim da reprovação

Olá...

Mais uma vez reproduzo reportagem que retirei do Jornal da Ciência. Entendi que o tema é de relevância para nossas discussões no grupo. 

Alguém ousaria comentar algo sobre o assunto? Ou será que nos acovardaremos e não emitiremos opinião?

Espero respostas às provocações.

Abraços.


Por Carolina Benevides
Capturano no JC e-mail 4016, de 24 de Maio de 2010.

Para reduzir evasão, plano é que escolas aprovem todos os alunos dos três primeiros anos do ensino fundamental

Com os dados do censo escolar de 2008 em mãos, quando 74 mil crianças de 6 anos foram reprovadas, e depois de realizar três audiências públicas - em Salvador, São Paulo e no Distrito Federal - o Conselho Nacional de Educação (CNE) se prepara para recomendar "fortemente" que todas as escolas públicas e privadas não reprovem mais alunos matriculados nos três primeiros anos do ensino fundamental.

A resolução, que terá que ser homologada pelo ministro Fernando Haddad neste último ano do governo Lula, entrará em vigor em 2011, segundo Edna Martins Borges, coordenadora-geral do Ensino Fundamental da Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação (MEC).

- O Brasil tem uma cultura forte de reprovação. Como estamos atualizando as diretrizes para a educação, vamos recomendar fortemente o princípio da continuidade. Sabemos que não tem a força de uma lei, mas as recomendações do CNE direcionam o sistema educacional - explica Edna, dizendo ainda que o Conselho espera que o Brasil deixe, daqui a alguns anos, de reprovar em todas as séries do ensino fundamental. - O ideal é que a criança conclua mesmo em nove anos, pois ser reprovada faz com que interrompa o sucesso escolar que poderia ter. No Nordeste, onde temos altas taxas de evasão, a reprovação é uma das responsáveis pelo aluno abandonar o colégio.

Para professor da UFRJ, mudança é 'temerária'

Segundo Edna, cada escola terá autonomia para elaborar seu projeto pedagógico, o que pode incluir flexibilização das turmas, trabalhos especiais para alunos em dificuldades e aulas extras.

No Brasil, segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), existem mais de 152 mil escolas, com 31 milhões matriculados no ensino fundamental. Pouco mais de dois milhões têm mais de cinco horas de aula por dia.

- Largadas à própria sorte, sem respaldo das secretarias de educação e do MEC, as escolas dificilmente terão sucesso. A história já mostrou que desacompanhada de professores bem formados, sem boa gestão, sem recursos corretos para ajudar no aprendizado e com grande número de alunos em sala, a progressão não dá bom resultado - diz Claudia Fernandes, coordenadora da Pós-Graduação em Educação da UniRio.

Professor de políticas públicas e formação humana da UERJ, Gaudêncio Frigotto concorda que propor a mudança deixando que as escolas decidam o que fazer é "temerário".

- Não adianta as crianças terem o direito de passar, se não têm o direito de aprender. As escolas públicas do Brasil são também espaço de merenda, de educação sexual, têm que lidar com a violência, não estão só ligadas ao conhecimento. Legalizar a realidade que temos em sala de aula com aprovação automática é temerário.

Responsável por uma turma do 3º ano do ensino fundamental em uma escola municipal em Cordovil, na Zona Norte do Rio, Inês Barbosa já convive com a aprovação automática e acha que o respaldo do MEC prova que "o ministério não conhece o que enfrentamos no dia a dia":

- Tenho uma turma com 32 alunos entre 8 e 11 anos. Os que têm dificuldades tinham a ajuda de uma estagiária, mas agora ela só pode atender no mesmo turno das aulas. Então, eles vão às aulas ou ao reforço - diz Inês. - O MEC propor que professores criem alternativas quando estão sobrecarregados, sem material didático, em escolas sem horário integral e lidando com pais que muitas vezes não podem acompanhar os estudos dos filhos é a prova de que não conhece o que enfrentamos.

Professor da Faculdade de Educação da USP, Vitor Henrique Paro gostaria que o MEC tivesse coragem para acabar com a aprovação em todas as séries.

- Não sei porque a timidez, a reprovação é um mal - diz ele, para quem as escolas são "ruins desde o século XIX e a reprovação é o álibi desse modelo". - Essa mudança é um primeiro passo para que haja uma revolução. Os pais vêem os filhos sendo reprovados e acham que eles não servem para estudar.

Com a aprovação automática, os pais terão a chance de entender que há algo errado com a escola, pois seus filhos poderão chegar ao 8oano e isso não será sinônimo de que aprenderam algo. Se for proibido reprovar, as pessoas serão obrigadas a ensinar

'É perverso deixar alguém continuar analfabeto", entrevista com Claudia Fernandes

Professora há 28 anos, Claudia Fernandes, coordenadora da Pós-Graduação em Educação da UniRio, vê com ressalvas a recomendação do CNE para todas as escolas do país. "Desacompanhada de reorganização pedagógica, vai acabar com o problema da reprovação nos três primeiros anos, mas vai reprovar no quarto."

Leia a entrevista:

- Como a senhora vê a proposta do CNE de não mais reprovar os alunos dos três primeiros anos do ensino fundamental?

Pode ser um avanço se forem pensadas maneiras de implementar esse sistema. Mas sabemos que boa parte das escolas brasileiras só tem professor e giz. Não são bem equipadas, os professores dão aulas para turmas com mais alunos do que o ideal, não têm formação continuada e trabalham sem ter acesso às novas tecnologias. Desacompanhada de reorganização pedagógica, a promoção automática vai acabar com o problema da reprovação nos três primeiros anos, mas vai reprovar no quarto ano. O CNE diz que as escolas terão autonomia para decidir as estratégias que vão adotar. A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) determina que cada escola tenha autonomia. Mas se elas ficarem à sua própria sorte, provavelmente o sistema não dará certo. É preciso que tenham apoio das secretarias de educação e do MEC, medidas que sejam comuns a todas e apoio logístico e financeiro.

- Ao adotar a progressão automática, a escola deixa de avaliar os alunos?

Avaliação não é sinônimo de prova, aprovação ou recuperação. O senso comum acredita que a reprovação garante mais qualidade e aprendizagem, mas o que garante uma boa escola são professores bem formados e com recursos para trabalhar, boa gestão e equipamentos que possam ser usados para auxiliar o aprendizado. Tanto que reprovamos e mesmo assim temos alunos que não sabem ler, escrever ou calcular. Então, acredito que quando há progressão automática é preciso que haja um processo de avaliação até mais criterioso e qualitativo.

- A evasão escolar diminui quando a progressão automática é implementada?

A educação está colada ao contexto social, e é fato que as crianças que são reprovadas várias vezes abandonam a escola. Então, historicamente, há uma melhora nesses índices, assim como há melhora também nos índices de rendimento com a progressão automática.

- E isso é positivo?

Tem um lado bom, porque as crianças ficam na escola, não vão para as ruas, nos grandes centros podem até ficar afastadas do tráfico, mas o problema é: estão na escola de que maneira? Estão aprendendo? A progressão automática não pode só ter essa justificativa, de manter as crianças em sala de aula, justificativas econômicas, como baratear o ensino, ou de melhorar os índices. É perverso reprovar, mas é perverso também deixar alguém frequentando a sala de aula e continuar analfabeto.

Publicado originalmente em O Globo, 23/5.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Um ensino de ciências sem ciências: um simulacro de educação científica


Olá...

Resolvi novamente transcrever na íntegra um texto que considerei interessante e que aborda o ensino de ciências nas escolas ou, mais especificamente, o que aparenta ser o ensino de ciências.

Vale ler. E vale mais ainda refletir.

Abraços. 


Artigo de Cássio Costa Laranjeiras
Obtido no JC e-mail 3980, de 31 de Março de 2010.

"Encerrada em permanente duelo entre o ensinar e o aprender (em que ambos saem vitimados do confronto) a nossa escola "ensina", mas não aprende. Não aprende porque não estuda"

Cássio Costa Laranjeiras é graduado em Física pela UFRJ, mestre em Ensino de Física e doutor em Filosofia da Ciência pela USP. É professor no Instituto de Física da Universidade de Brasília (UnB). Artigo enviado pelo autor ao "JC e-mail":

Em que pese a ênfase da afirmação contida no título deste artigo, que muito provavelmente soará desagradável aos ouvidos de muitos, não pude furtar-me em fazê-lo. Ele traduz bem uma percepção de há muito instalada em mim e somente não constatada em meu contato com o ensino de ciências na educação básica no Brasil em situações de pura excepcionalidade.

Nosso ensino de ciências tem abdicado das ciências, tornando-as ausentes de seu contexto, não poucas vezes negando-as, razão pela qual tem se convertido em mero simulacro de educação científica. Dessa forma, constitui-se em uma realidade auto-referenciada e bastante alheia àquela que deveria servir-lhe de inspiração e referência: a da ciência.

O sentido da investigação científica, para o qual as diferentes disciplinas da área de Ciências da Natureza deveriam convergir, tem se perdido em meio a práticas pedagógicas que, desconhecendo o processo mesmo de construção da ciência, vem violentando a sua integridade na escola, promovendo pseudo-apropriação de informações desconexas, travestidas de conhecimento científico.

Os "projetos de investigação", estratégia privilegiada de uma boa iniciação à ciência, quando propostos de maneira séria são quase que na generalidade desconsiderados; as "bibliotecas", celeiros de informação e conhecimento, quando existem fisicamente, o que já é raro, não são percebidas e utilizadas como espaço formativo.

A desculpa padronizada tem sido a de que estamos na era da internet, do virtual. De fato aqui caberia o uso da expressão "literalmente virtual", pois elas inexistem no mundo real; a "experimentação", que bem planejada e devidamente conduzida do ponto de vista didático reúne elementos significativos para uma boa iniciação à ciência, visto que capaz de explicitar e traduzir a dimensão empírica inerente às ciências da natureza, quando considerada, é já naturalmente percebida como acessória, ação meramente complementar e "cosmética" ao processo de ensino-aprendizagem da ciência.

Neste caso específico o simulacro adquire uma maior complexidade, quando muitas vezes vemos a experimentação substituída em sua integridade epistemológica por "atividades", "atividades práticas" para ser mais preciso no uso genérico em que a expressão vem sendo usada.

É como se, simplesmente por fazerem uso de materiais concretos, manipuláveis, seja de baixo ou alto custo, ou até mesmo sucata (como virou moda dizer) tais práticas pudessem automaticamente reivindicar para si a categoria de Experimentação Científica Didática.

Alto lá. "Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa". Não que essas "atividades práticas" não devam ter espaço e lugar na escola. Levando em conta que nos encontramos em uma sociedade que, por sua fragilidade social, acaba remetendo à escola a responsabilidade completa da formação educativa de crianças e jovens, é razoável pensar que esta última acabe também realizando essa tarefa. O que questiono e denuncio aqui é o equívoco de confundi-las ou torná-las substitutas da "experimentação".

Se levarmos em conta que "nosso espírito tem a tendência irresistível de considerar como mais clara a idéia que costuma utilizar com mais freqüência", resgatando aqui o pensamento de Gaston Bachelard (1881-1962), educador e epistemólogo francês, não seria de todo surpreendente que a ausência de atitude e prática investigativas em nossa educação básica denuncie a sua infrequência no processo formativo do professor. Daí que tenha se tornado pouco clara a ideia e a necessidade da experimentação científica autêntica no ensino de ciências.

Os "clubes de ciências" e as "feiras de ciências" foram importantes estratégias potencializadoras da criatividade e da inovação na educação científica do passado no Brasil e certamente devem ter papel assegurado nos tempos de hoje e naqueles que estão por vir.

É claro que, para que cumpram o seu papel de maneira eficiente, faz-se necessário planejamento e organização escolares responsáveis. Os projetos de investigação desenvolvidos pelos estudantes devem ser objeto de detalhado planejamento pedagógico, desenvolvido ao longo de todo o ano letivo, e não fruto de ações improvisadas de um par de semanas ou mesmo dias, como tão freqüentemente vemos acontecer.

Os "cadernos de pesquisa", "diários de bordo" etc., seja lá que nome se utilize, são outro aspecto importante neste processo. Eles devem se caracterizar enquanto registros vivos da ação investigativa empreendida pelos estudantes ao longo de todo o ano letivo e objeto de acompanhamento pelo professor. Isso é bem diferente de "trabalhos", cujo conteúdo é mera cópia de sites da internet, blogs, e coisas do gênero. O fato é que o famoso "copiar e colar" tem "colado" em nossas escolas. Simulacro, mero simulacro.

As conseqüências de tudo isso são que nosso ensino de ciências não consegue se projetar para além das aparências, pelo menos é isso que se depreende das avaliações especializadas sérias que, recorrentemente, em termos de qualidade o situam em patamar abaixo do mínimo desejado para os diferentes níveis de ensino da educação básica.

Mas não podemos nos deixar iludir. É necessário repensar a escola. Encerrada em permanente duelo entre o ensinar e o aprender (em que ambos saem vitimados do confronto) a nossa escola "ensina", mas não aprende. Não aprende porque não estuda. Daí que o ensinar da escola tenha se convertido num "pseudo-ensino", com gravíssimas conseqüências para a cultura, sobretudo a cultura científica e tecnológica, ainda tão incipiente (talvez devamos mesmo assumir que ela inexiste) no ambiente escolar.

Se o autêntico saber é um pensar, retomando aqui posição defendida por Caio Prado Jr. e Paulo Freire, dois eminentes e singulares brasileiros do século XX, a autenticidade da educação científica reivindicaria a atribuição de valor ao próprio pensamento, o que parece não ser regra em nossas escolas, cujas práticas convergem para o seu embotamento.

Se tomarmos a criatividade como um processo mental de geração de novas ideias por indivíduos ou grupos, logo nos daremos conta da importância e significado do desenvolvimento de uma postura investigativa em nossas aulas de ciências.

É no contato vivo com o mundo das ideias que as nossas próprias são mobilizadas, seja como desenvolvimento daquelas já existentes, seja como alternativa ou contraponto; em ambos os casos sempre em decorrência da necessidade de entendimento, de compreensão, de busca de solução para uma dada questão.

É também de G. Bachelard a afirmação de que "para o espírito científico todo conhecimento é resposta a uma questão. Se não houver questão, não pode haver conhecimento científico". Já aqui se pode identificar orientação segura para uma educação científica inovadora. Por mais incrível e surpreendente que possa parecer, a aparentemente óbvia proposta de Bachelard ainda se nos apresenta como um grande desafio.

Muitos poderão argumentar, quem sabe precipitadamente e dominados pela tradicional e caótica organização (ou falte de) escolar, que esse processo é muito complexo e trabalhoso. E daí? É isso mesmo. Como tudo que se pretende de qualidade, também a educação reivindica disciplina, trabalho. Deixemos de lado o facilismo. É necessário romper com a recorrente ilusão de que atalhos sejam capazes de nos conduzir a uma condição de formação educacional de qualidade. Somente assim seremos capazes de superar o simulacro.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Cenários e tendências da educação superior brasileira


Olá a todos...

Reproduzo abaixo artigo que entendi ser importante para as discussões do grupo. Espero que gostem e que comentem sobre ele. Aliás, faz-se importante que nós, do grupo, comentemos os textos aqui postados ou reproduzidos. Acredito que as discussões são importantes. pensem nisso!

Abraços.


Artigo de Ronaldo Mota
Capturado do JC e-mail 4008, de 12 de Maio de 2010.

"Não há teoria educacional aceitável que não esteja baseada na prática. Pouco coopera também a prática dissociada e que dispensa teorias"

Ronaldo Mota é secretário de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) e professor do Departamento de Física da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Artigo enviado pelo autor ao "JC e-mail":

A compreensão adequada do mundo atual passa por, a partir do conhecimento do passado e da percepção do presente, ampliar nossa capacidade em definir tendências. Estudar tendências não é o mesmo que prever futuros, mas sim tratar analiticamente as possibilidades múltiplas do futuro. Listaremos a seguir algumas tendências educacionais.

Tendência 1: Educação flexível, em oposição às modalidades tradicionais presencial e a distância

Emerge no cenário atual uma tendência denominada educação flexível, a qual incorpora as duas chamadas modalidades, presencial e a distância. Esta tendência surge em contraposição à caracterização geral que acredita nas duas modalidades como coisas separáveis, distintas e até mesmo antagônicas.

As atividades propostas aos estudantes que precedem os momentos presenciais não têm a intenção de substituí-los, mas de prepará-los para uma nova dinâmica de sala de aula. As abordagens aqui propostas aproximam-se daquilo que costumamos denominar de modalidade híbrida flexível, a qual procura combinar os elementos mais adequados das duas modalidades, presencial e a distância.

Educação flexível permitirá que num cenário próximo que cada estudante ao início do calendário letivo possa, por exemplo, escolher algumas disciplinas com características mais presenciais e outras a distância. Aquelas hoje chamadas presenciais farão uso de muitas ferramentas que atualmente associamos com a modalidade a distância. Por sua vez, as disciplinas ditas a distância incorporarão cada vez mais atributos da presencialidade, trabalhos em equipe com seus colegas, laboratórios etc., originalmente características que costumamos associar com a modalidade presencial.

Tendência 2: Andragogia versus pedagogia

A segunda tendência diz respeito às concepções andragógicas, associadas à necessidade de repensar nossas metodologias educacionais à luz do fato que boa parte de nossos estudantes da educação superior brasileira está alterando rapidamente seu perfil de faixa etária, origem socioeconômica e suas expectativas.

Os dados recentes do Inep apontam que já são mais de 40% das matrículas no ensino superior de estudantes com mais de 25 anos. Ainda assim, por incrível que pareça, a pedagogia (de paidós, criança em grego) permanece sendo a abordagem absolutamente dominante, independente e indistintamente de estarmos lidando com crianças, jovens, adultos ou população mais idosa.

Na verdade, andragogia (de andros, em grego homem/adulto) é um conceito educacional diferenciado, especialmente voltado à educação de adultos, permitindo oportunizar experiências educacionais inovadoras. Nessas abordagens, os estudantes têm um papel mais ativo em seus processos de aprendizagem, em coerência com as perspectivas de formação continuada e ao longo da vida, superando o período de educação escolar tradicional.

Dentro das abordagens andragógicas, haverá uma tendência crescente no sentido de recuperar o Método Keller. Trata-se de método, também conhecido como Processo Autoinstrutivo, que faz uso de uma estratégia no processo ensino-aprendizagem que é diferente substancialmente das metodologias tradicionais, as quais são baseadas tipicamente em aulas expositivas como meio primário segundo o qual os estudantes tomam contato com a matéria.

Tendência 3: Contribuições centrais dos laboratórios e do trabalho em equipe

Dois elementos educacionais, que por descuido têm sido entendidos como meramente complementares, são, de fato, essenciais no processo ensino-aprendizagem. São eles:

1. o laboratório como espaço de prática, onde os conceitos são consolidados, os pensamentos abstratos assumem a solidez da experimentação e efetiva-se a oportunidade de erros e acertos, simulando o exercício mais próximo possível da atividade profissional, reforçando as bases do pensar segundo o método científico;
2. o trabalho em equipe, onde aspectos primordiais do aprendizado são explorados, via construção coletiva, onde a percepção do(s) outro(s) é experimentada e desenvolvida, despertando e incrementando o (re)conhecimento das limitações e potencialidades, próprias e dos demais, além de ser espaço preferencial para cultivar o respeito à tolerância e à diversidade.

Há que se possibilitar a formação de profissionais sem medo de inovações tecnológicas, sejam elas quais forem. Postura frente ao inédito passa a ser mais ou tão importante como conhecê-lo, dado que perene, permanente, hábito, costume. Estamos no mundo da educação permanente, ao longo de toda vida, etapas que se sucedem, sendo estudantes para sempre. Ou nos acostumamos a esta nova realidade ou ela nos atropela. São etapas infindas, sucessivas e permanentes.

Tendência 4: Simples, basta estudar antes

Não há teoria educacional aceitável que não esteja baseada na prática. Pouco coopera também a prática dissociada e que dispensa teorias, dado que errática. Se um resumo fosse necessário para identificar de forma sintética a "novidade" ou "característica" do processo proposto, diria que o melhor seria: simples, basta estudar antes.

Em geral os métodos educacionais adotados no ensino superior não destoam significativamente das metodologias pedagógicas anteriores, muitas vezes agravados pelo estímulo à memorização e preparação a responder questões, elementos típicos associados aos processos seletivos que ainda perduram.

Trata-se efetivamente de mudar uma cultura. Antiga porque calcada em hábitos que vem da educação básica e arraigada porque envolvendo todos os atores, tanto estudantes como professores. No entanto, não há outro caminho capaz de formar pessoas preparadas adequadamente aos nossos tempos, daí o realismo de estimular a aprender a estudar antes. As novas tecnologias permitem que, de forma cada vez mais simplificada, os conteúdos sejam facilmente acessíveis a todos e com a devida antecedência.

Tendência 5: O fim da mezo escala nas instituições de ensino superior

Há uma tendência clara à incorporação das instituições menores pelas maiores, gerando a formação de empresas, as quais muitas vezes se estabelecem como capital aberto em bolsas de valores, espaços compartilhados de controle e de definição de valores.

Talvez seja ainda prematuro para emitir juízos definitivos de valor e tendências de ganho ou perda de qualidade. No entanto, é perceptível que tais movimentos caminham em direção à incorporação de metodologias educacionais padronizados, currículos unificados, ensino mais estruturados e cada vez menos espaço para metodologias inovadoras, dependente de conjunto específico de professores ou de especificidades regionais ou de propósitos peculiares a certo contexto ou clientela. Tende-se nas instituições componentes de um grande grupo a um processo de pasteurização metodológica, fruto do aproveitamento do fenômeno escala e otimização de custos.

Neste cenário, creio que sobreviverão, além dos grandes grupos, pequenas instituições, desde que consigam explorar suas especificidades e peculiaridades, bem como agilidade e ousadia de incorporar novos modelos acadêmicos. Fazer uso de suas escalas reduzidas, frente a uma conjuntura educacional em que todos estarão desafiados a se reestruturarem, pode ser uma agradável novidade em um cenário em que instituições de porte médio (mezoescala) tenderão a desaparecer.

Tendência 6: Extrema judicialização versus abordagens educacionais

Está em curso uma febre jurídica que assola a educação superior no país. Baseados na fé da capacidade normativa abundam decretos, portarias, resoluções e órgãos. Em que pese a boa fé das iniciativas, nada mais são do que reflexos perversos da falta de perspectivas educacionais. A ausência do saber o que fazer educacionalmente é preenchida pela edição de normas, sem perceber que as normas não só não induzem qualidade como, ocasionalmente, a prejudicam sobremaneira.

Curiosamente, os instrumentos jurídicos criados, que têm seus estímulos principais no controle do setor privado, geram máquinas de desestímulo às necessárias inovações e ousadias acadêmicas, as quais, em geral, têm no terreno normativo extremado seus maiores inimigos.

Em tese, o setor privado poderia estar experimentando novas experiências, em termos de modelos acadêmicos e adoção de metodologias inovadoras, com vigor e disposição. Mas, definitivamente, não está. Pelo menos, não na escala desejável.

As razões são múltiplas, mas o cerceamento normativo, fruto da extrema judicialização do ensino superior é uma das razões principais. Não se está fazendo uso, infelizmente, dos atributos resultantes de sua maior agilidade, de sua mais natural flexibilidade, especialmente em instituições de menor porte, e maior capacidade de impor comandos mais rapidamente.

As tendências acadêmicas experimentadas pelas pequenas instituições ousadas poderão no futuro próximo representar um desafio capaz de amedrontar o dragão dos empecilhos jurídicos normativos que ocupam os espaços educacionais.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Educação: para onde vamos?



Artigo de Isaac Roitman
Capturado no JC e-mail 4007, de 11 de Maio de 2010.

"Temos que decidir agora qual país legaremos aos nossos descendentes"

Isaac Roitman é membro titular da Academia Brasileira de Ciências e coordenador do Grupo de Trabalho de Educação da SBPC. Artigo publicado no "Correio Braziliense":

Na maioria dos países, os sistemas educacionais estão sendo revistos. Espera-se que a educação prepare os jovens para o mundo do trabalho, para sua independência econômica, para que eles possam viver de forma construtiva em comunidades responsáveis e para que possam conviver e compreender a diversidade cultural de uma sociedade que se transforma de uma forma muito rápida. Espera-se que a educação ajude os jovens a construírem suas vidas em um cenário de futuro que ninguém com certeza pode predizer.

No Brasil, há muitas décadas todos os governos proclamam que a educação é sua meta prioritária. Proclamação demagógica e enganosa. Segundo todos os índices e pesquisas nacionais ou internacionais, a qualidade da educação brasileira é cada vez mais vergonhosa, constituindo-se como a maior das tragédias nacionais. O papel do educador enquanto facilitador da liberdade de aprendizagem para transformar socialmente os indivíduos não passa de uma intenção não concretizada na educação brasileira.
Ainda durante 2010 o Congresso Nacional definirá o Plano Nacional de Educação (PNE), estabelecendo as metas e prioridades para o período de 2011 a 2020. A discussão será baseada nas proposições que deverão emergir da Conferência Nacional de Educação (Conae), evento que terminou no início de abril. Certamente, nossos parlamentares terão um cardápio de ações relevantes para a melhoria da qualidade de educação em todos os níveis.

O PNE atual, assim como os anteriores, deverá pautar as ações necessárias em várias dimensões para mudar o cenário da educação do país: 1. Qualificação de professores com formação científica atualizada, adequada e comprovada; 2. Condições de trabalho que permitam a atualização permanente e acesso às metodologias modernas do ensino e aprendizagem; 3. Remuneração atrativa; 4. Substituição de conteúdos inúteis por exercícios de criatividade, crítica e de resolução de problemas; 5. Arquitetura escolar adequada; 6. Gestão eficiente; e 7. Avaliação interna e externa. Ou iniciamos agora uma verdadeira revolução na educação ou estaremos a lamentar nas próximas décadas ter perdido mais uma oportunidade de sermos protagonistas da transformação social que nosso povo merece.

Sempre é bom lembrar e destacar que há algumas décadas vários países decidiram eliminar a tragédia da educação que os assolavam. Esses países não estavam em situação muito diferente da nossa. Vamos lembrar o exemplo da Coreia do Sul, que na década de 50 do século passado estava destruída por uma guerra civil que dividiu a Coreia ao meio e a maior parte da população vivia na miséria. Um em cada três coreanos era analfabeto. Hoje, oito em cada 10 chegam à universidade.

A transformação começou com uma lei - integralmente respeitada - que tornou o ensino básico prioridade. Inicialmente, os recursos foram concentrados nos primeiros oito anos de estudo. Os frutos dessa decisão não demoraram a serem colhidos. O país começou a crescer rápido, em média, 9% ao ano, durante mais de três décadas. Hoje, graças à sólida massa crítica de cientistas que forma todos os anos, a Coreia está pronta para entrar no Primeiro Mundo, tendo como cartão de visita uma incrível capacidade de inovação tecnológica.

Poderíamos pensar que os coreanos perderam a inquietação dos anos 1950. Ledo engano. Em dezembro de 2009, um documento foi elaborado pelo Ministério da Educação e Ciência e Tecnologia daquele país: Políticas e planos para 2010. Uma das metas seria o estímulo à criatividade na educação, sobretudo na básica. A meta envolvia a redução dos conteúdos e o incentivo ao domínio das linguagens, da matemática, dos estudos sociais e da ciência, da consciência da diversidade cultural, da habilidade para solução de problemas e da capacidade de trabalhar em grupos.

Temos que decidir agora qual país legaremos aos nossos descendentes. Se nada fizermos, seremos no futuro uma sociedade com graves injustiças sociais, com índices assustadores de violência, com total desrespeito ao próximo e outras mazelas amplificadas que temos no presente. Certamente seremos um país colonizado e explorado. O futuro da educação está em nossas mãos. Cabe a todos nós decidir para onde vamos.

Originalmente publicado no Correio Braziliense, 11/5

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Algumas novidades...

Olá...

Vasculhando um pouco a net em busca de atualização, cheguei a dois blogs interessantes que foram adicionados nas sugestões de navegação, que fica na barra lateral deste blog. São eles: EDUC@TIC e BLOG DO PEDRO DEMO. Encontrei conteúdos interessantes nos dois e sugiro que dêem uma navegada por eles.

Além dos Blogs, sugiro aos interessados nas aplicações das TICs em Educação, que leiam ou baixem o e-book THE AMAZING WEB 2.0 PROJECTS BOOK. Nele estão relatos de projetos de aplicação das TICs, em especial dos recursos da Web 2.0 ao ensino. Vale vasculhar o material. Muito interessante em minha avaliação.

Até...

sábado, 1 de maio de 2010

Universidade e conhecimento

Oi, pessoALL!

Depois de alguns dias mexendo no layout do blog, inicio minha participação indicando um texto que, em minha opinião, tem bastante a ver com o que discutimos a respeito da constituição de um Grupo de Estudos e Pesquisas no contexto da Universidade. Serve para suscitar algumas reflexões sobre o que é o conhecimento, o que é a pesquisa e qual a formação que buscamos.

Trata-se de um texto de um professor que admiro e cujas idéias têm auxiliado em meus estudos já há alguns anos: Nílson José Machado, da FE-USP. O artigo traz diversas questões - algumas polêmicas - que poderemos aprofundar ao longo de nossos encontros!

O texto está disponível no link abaixo:

A Universidade e a organização do conhecimento: a rede, o tácito, a dádiva

Boa leitura a tod@s!!

Abraços...

Cris Pátaro